Contratos no Ciberespaço

Traduzido por: r3ck 
Revisado por: Cypherpunks Brasil

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David Friedman

4 de Maio de 2000

Nas sociedades modernas contratos são fortalecidos de duas maneiras bem diferentes: governamental, através dos tribunais, e privadamente, na maioria das vezes por reputação. Um exemplo no caso dos contratos fortalecidos por reputação, considere uma loja de departamento que garante reembolso caso você não esteja satisfeito com o produto. Se você comprou uma jaqueta do tamanho errado e sua esposa falou que roxo não combina com você, dificilmente você iria processar a loja - o valor não vale o tempo e o trabalho que você teria. Não obstante, quase todas as lojas em uma situação como essa vão, pelo menos em minha experiência, receber o produto de volta e te reembolsar - pois eles querem manter a reputação, com você e com as pessoas que você vai falar sobre o incidente, deles cumprirem promessas.

Para um caso mais elaborado de contatos fortalecidos por reputação, temos o exemplo da indústria de diamantes de Nova Iorque, como descrito no artigo de Lisa Bernstein [1]. Em um ponto no tempo, um pouco antes dela ter estudando-a, a indústria estava em sua maior parte nas mãos de judeus ortodoxos, que por crença religiosa não processam uns aos outros. As disputas eram então acertadas por meio de um árbitro confiável e por sanções de reputação. Se uma das partes da disputa não aceitasse o veredito do árbitro, isso iria se espalhar pela comunidade de tal forma que ele não poderia mais “funcionar” naquela indústria. O sistema de reputação continuou funcionando mesmo após a indústria ficar com membros mais diversos, com organizações como New York Diamond Dealer’s Club provendo árbitros confiáveis e espalhando informações.

A tese central desse artigo é que para os futuros contratos no ciberespaço, contratos governamentais vão funcionar pior e os contratos privados melhor do que funcionam atualmente no “espaço real”. A segunda tese é que enquanto os fatores que fazem os contratos públicos menos funcionais no ciberespaço não vão se aplicar para eles no “espaço real”, por outro lado os que fazem os contratos privados funcionarem melhor no ciberespaço vão fazer eles funcionarem melhor no “espaço real”. Portanto esperamos uma mudança nos contratos de públicos para privados tanto no “espaço real” quanto no ciberespaço, porém com maior força no ciberespaço.

Problemas na execução de contratos no ciberespaço

Atualmente existe um rápido aumento da atividade comercial no ciberespaço, principalmente na WWW. Isso coloca gera dois problemas bem diferentes para os contratos públicos. O primeiro, que será importante em um futuro próximo, é que o ciberespaço não tem fronteiras geográficas, fazer compras de um lugar do outro lado do mundo é tão simples quando comprar algo na esquina. Entrega de mercadorias físicas é mais caro se vier do outro lado do mundo, entretanto boa parte dos produtos no ciberespaço são digitais e serviços, eles podem ser entregues online. Seguindo a lógica cada vez uma porcentagem maior das transações comerciais, principalmente a entre dois indivíduos, vão ser entre partes de países diferentes.

Contratos governamentais entre partes de dois países diferentes é mais cara e incerta do que se fosse em uma mesma jurisdição. Outro problema é que em um mundo onde as fronteiras são invisíveis, as partes não vão saber quais leis o contrato deve respeitar. Portanto contratos públicos, mesmo ainda sendo possível utilizá-los no futuro para contratos online, serão menos eficientes do que eram no espaço real.

Um segundo, e mais sério, problema que poderá surgir no futuro resultando do desenvolvimento tecnológico que já existem e estão entrando no uso comum. Essas tecnologias que a parte mais fundamental é a criptografia por chave privada, faz com que seja possível um mundo virtual onde as pessoas façam transações anonimamente com a reputação relacionada a identidade virtual da pessoas e não a identidade real [2].

Existem diversas razões para que no futuro as pessoas usem essas tecnologias. Uma delas é privacidades, as pessoas não querem que os outros saibam o que elas estão lendo, comprando ou falando online [3]. Uma segunda é para evasão fiscal - é difícil do governo taxar aquilo que ele não está vendo. Uma terceira é para escapar de regulamentações - seja regulações comerciais nos EUA ou regulações religiosas em um país controlado por muçulmanos fundamentalistas. Anonimidade é provavelmente muito atrativa para pessoas vivendo em lugares do mundo onde os direitos de propriedades não são seguros, fazendo com que sigilo seja uma forma valiosa de proteção. Se por razões como essa ou outras uma parte significante do comércio virar anônimo, contratos aplicados publicamente se tornaram cada vez mais irrelevantes, é difícil processar alguém quando não se sabe quem ele é ou em qual continente ele vive.

Fortalecimento Privado de Contratos

E a alternativa privada? Em um primeiro momento alguém pode achar que os mesmos fatores que fizeram os contratos públicos menos fortalecidos vão fazer com que contratos privados não sejam apenas mais difíceis de aplicar, mas impossíveis. A loja mantém suas promessas, em parte por saber que por saber que se eu estiver insatisfeito por causa deles as pessoas com quem vou falar provavelmente também compram lá, em um futuro sem fronteiras, onde todo mundo compra de todas as partes do mundo, isso é muito menos provável. E não é trivial como atingir a reputação de alguém sem saber o nome da pessoa.

Ambos problemas são solucionáveis, o comércio online não apenas fornece substitutos para os mecanismos de reputação que já estamos familiarizados, mas alternativas superiores

Peguemos por exemplo o problema de passar a informação de um consumidor para outro. Comparado com a fofoca local um mecanismo de busca bem feito é muito superior. Atualmente, se estou pensando em fazer negócios online com uma pessoa e quero saber se alguém já teve problemas com ela, eu não vou gastar meu tempo perguntando a amigos ou indo ao Better Business Bureau. Em uma minuto de pesquisa na Deja News vai mostrar se alguém na Usenet News mencionou aquela pessoa no último ano e o que eles falaram sobre ela.

Os sites de ecommerce já estão usando esses mecanismos. Por exemplo o eBay (um reconhecido site de leilões online), o sistema deles permite que qualquer pessoa que ganhou o leilão colocar um comentário sobre o vendedor - se a mercadoria está como mencionada na descrição, se chegou rápido ou qualquer outra coisa que a pessoa quiser falar. Os comentários estão disponíveis, tanto em forma reduzida como na totalidade, para qualquer um que esteja em um leilão daquele vendedor.

Até agora eu tenho considerado sistemas de reputação informal, a equivalência online do sistema que mantém a loja de departamento local honesta. E quando a sistemas formais? aqui os sistemas do ciberespaço tem vantagens sobre os do espaço real.

Pensando um pouco sobre como o sistema de reputação funciona. A razão que a loja, ou o vendedor de diamante desonesto, está preocupado com sua reputação não é por medo de ser odiado, mas por medo de perder negócios. O motivo que seu amigo não vai comprar na loja que você disse que não ia aceitar sua jaqueta de volta não é por querer punir a loja por ter te prejudicado, mas por que ele não quer ser prejudicado. O sistema de reputação funciona espalhando informações verdadeiras sobre mal comportamento, informação que faz com que o receptor dela mude seu comportamento de um modo que seja custoso ao agente que trapaceou.

A outra parte crítica é o custo da terceira parte de conseguir informações confiáveis sobre o que ocorreu. Na maioria das disputas uma parte aponta o dedo para o outro falando que está certa e a outra está errada. Quando eu conto para meu amigo que fui mal atendido na loja de departamento, espera-se, que ele me conheça bem o bastante para saber se deve ou não confiar em mim. Entretanto quando leio um post na Usenet News criticando uma empresa eu não tenho nenhum tipo de informação sobre o autor. Eu tenho que formar minha opinião baseada em evidência interna - será que o autor parece estar certo? - e consistência com outras fontes de informação, como a resposta de outras pessoas ao post.

Quando se trata de quantidades substanciais em jogo, arbitragem [4] é um bom mecanismo para diminuir o custo de informação. O vendedor de diamantes de Nova Iorque não precisa saber todos detalhes da controvérsia - basta saber o veredito e se a parte que causou o dano pagou as devidas compensações. O sistema funciona, pois mesmo que a parte não saiba os detalhes da controvérsia, ele sabe que o árbitro é idôneo e competente. Tecnologia computacional apresenta um alternativa que necessita de menos informação além de ser mais barata.

Chaves e assinaturas: uma breve digressão

Para eu explicar como a equivalência funciona é necessário ter alguns conceitos em mente, se o leitor conhecer conceitos como criptografia de chave pública e assinatura digital pode pular essa parte.

Criptografia de chave pública é um mecanismo matemático para embaralhar e desembaralhar mensagens. Ela usa duas chaves, números distribuídos de certa forma para embaralhar a mensagem. A “sacada” do sistema de criptografia de chave pública é que uma das chaves é usada para embaralhar a mensagem e a outra para desembaralhar. Se eu tiver uma das duas chaves eu consigo criptografar a mensagem, mas se alguém quiser descriptografar vai precisar utilizar a outra chave. Essas chaves são geradas juntas facilmente, porém é muito complicado calcular uma chave com base na outra.

Para utilizar criptografia de chave pública é necessário gerar o par de chaves. Uma delas é a chave pública, que você pode compartilhar com qualquer pessoa que você esteja correspondendo, a outra é a privada, que você deve manter completamente em segredo.

Se alguém quiser te mandar uma mensagem para você ela pode criptografar essa mensagem usando a sua chave pública, como só você tem a chave chave privada somente você pode descriptografar a mensagem. Se alguém quiser assinar uma mensagem digitalmente ele a criptografa usando a chave privada [5] e anexa informações sobre como descriptografar a mensagem se identificando. O destinatário da mensagem obtém a chave pública e a usa para descriptografar a mensagem. Como a mensagem que ele recebeu é possível de ler e não é um monte de dígitos sem nexo, é a prova que foi você que mandou a mensagem, pois só você tem a chave privada para criptografar a mensagem.

A assinatura digital não só prova que foi você que mandou a mensagem, como assegura que a mensagem não foi alterada, ou seja, o remetente não pode negar que a mensagem é dele. Se o remetente tentar negar a mensagem, o destinatário pode mostrar que ele tem uma versão da mensagem que foi criptografada com a chave privada dele, isto é, só poderia ter sido criptografada pelo remetente.

Fortalecimento por reputação: convencendo partes terceiras

Imaginamos que nós estamos assinando um contrato online, especificando os nossos direitos e obrigações com um e outro. Neste contrato incluímos o nome e chave privada do árbitro que concordar em acertar as disputas entre nós. Então assinamos o contrato digitalmente e cada um fica com uma cópia.

Surge uma disputa, eu acuso você de violar os termos do contrato. Colocamos em questão com o árbitro. Ele julga em meu favor e diz que você deve me pagar $5000 por danos. Você se nega a pagar. Ele escreve o que aconteceu (ele julgou em meu favor e você se negou a aceitar o julgamento), ele assina digitalmente e me dá uma cópia.

Eu faço um documento (arrumar tempo melhor) juntando o contrato inicial (assinado digitalmente por nós dois e com a chave pública do árbitro) e o relato do árbitro sobre o que ocorreu (assinado digitalmente por ele). Eu envio esse documento para qualquer terceira parte que eu acho que se interessaria em saber se você é confiável e posto em um site para que todo mundo que pesquisa sobre você encontre a informação. A terceira parte (ou melhor, o computador dele), checa a assinatura digital no contrato com a do relato, usando a chave pública do contrato para checar se o árbitro do relato é o mesmo do contrato. A pessoa vai saber que você disse que aceitaria o veredito do árbitro, porém negou posteriormente - e descobrir isso não custou basicamente nenhum tempo.

Assinaturas digitais, portanto, reduzem drasticamente o custo de uma terceira parte descobrir se alguém é confiável ou não [6], então aumentando o muito o custo de uma empresa ou indivíduo de não serem confiáveis e renegando as cláusulas do contrato.

Esse tipo de contratos resolvem os problemas colocados por o ciberespaço não ter uma jurisdição geográfica. As leis não são definidas pela jurisdição, mas pelo árbitro escolhido pelas partes. Com o tempo, esperaríamos um ou mais padrões regras legais em relação aos contratos a desenvolver, como a lei historicamente se desenvolveu, com muitos árbitros ou empresas de arbitragem que adotam o mesmo ou regras legais semelhantes [7]. Então, as partes contratantes ai escolheriam árbitros com base na reputação.

Para transações de pequena escala você simplesmente coloca em seu navegador com uma lista de empresas de arbitragem aceitáveis, quando você contrata uma nova parte o software faz uma intersecção das duas listas. Se não existir um árbitro em comum ambas as partes recebem uma notificação ai dai elas decidem.

Os contratos privados também resolvem o problema quando uma das partes que permanecer anônima. Assinatura digital permite a combinação de anonimidade com reputação. Um programador que vive na Rússia ou no Iraque e está vendendo seu serviço online tem uma identidade online definida pela sua chave pública, qualquer mensagem assinada por aquela chave pública é dele. Aquela identidade tem uma reputação que foi ganha através de transações online no passado, quanto mais o programador se demonstrou honesto e competente mais pessoas vão querer empregar ele. Reputação é algo valioso, portanto o programador tem interesse em mantê-la respeitando seus contratos [8].

Trapaceando o Sistema de Reputação

Existe pelo menos um jeito que fortalecer os contratos no mundo virtual é mais difícil do que no mundo real. No mundo real minha identidade está ligada ao meu corpo, identificável pela minha face, digitais e tal. Eu não tenho a opção de após destruir minha reputação entrar em um novo corpo com uma cara nova, digitais novas e uma reputação limpa.

Online eu tenho essa opção. Enquanto tiverem pessoas dispostas a fazerem negócios com pessoas no mundo virtual que não estejam ligadas a uma pessoal real, eu vou ter a opção de começar a usar uma nova chave pública/chave privada e ir online com uma identidade nova e uma reputação limpa.

Não é que o sistema de reputação não vai funcionar, mas é que ele só vai funcionar para pessoas que tem um capital de reputação grande o bastante para que abandonar a persona online, junto com a reputação dela, seja mais custoso do que o benefício que se ganharia por uma trapaça. Então alguém que quer fazer negócios anonimamente teria que começar pequeno e ir construindo a sua reputação até um ponto que ela é boa o suficiente para que seja racional fazer negócios de maior valor com ele. Possivelmente o mesmo acontece na industria de diamantes atualmente [9].

O problema de troca de identidade não é limitado ao ciberespaço. Pessoas físicas tem digitais, mas pessoas jurídicas não. O equivalente do espaço real a criar novas chaves é preencher papeis para se criar uma empresa. Existe uma grande literatura sobre o assunto, mostrando que fachadas de mármore para os bancos e campanhas publicitarias caras como um certificado de reputação, que significa que a empresa quer continuar fazendo negócios, dando assim incentivo para que as outras pessoas confiem nela e agir de uma maneira que preservará sua reputação [10]. Uma persona virtual não tem a opção do mármore, pelo menos se quiser continuar anonimo, porém ela pode investir em uma longa serie de negócios ou publicidade, com o objetivo de atrelar isso a performance futura.

Ficamos com um problema obvio - como fazer com que indivíduos que não tem um grande histórico de transações conseguem garantir performance contratual nesse mundo? A resposta obvia é atrelar a reputação de alguém que já teve um bom histórico de negócios.

Eu, novamente, sou uma persona online anônima fazendo um contrato que me da a oportunidade de lucrar se quebrar ele. Desta vez, entretanto, não tenho reputação e nem tempo de criar uma reputação. Então eu ofereço fazer um cheque caução e deixar com um árbitro - em uma moeda digital anonima [11], considerando que quero manter minha anonimidade. O árbitro é livre para dar uma parte, ou todo, cheque caução para a outra parte caso eu quebre o contrato [12].

Essa abordagem ainda depende do fortalecimento por reputação, porém agora a reputação que está em jogo é a do árbitro. Caso ele roube o cheque caução que ficou com ele, dificilmente ele permanecerá no negócio. Se eu estiver preocupado com essa possibilidade eu posso pedir para que esse primeiro árbitro assine um contrato especificando um segundo e independente árbitro para resolver problemas entre eu e o primeiro árbitro. Minha assinatura no contrato não vale quase nada, pois eu não tenho reputação, porém a assinatura do primeiro árbitro no contrato dizendo que ele vai aceitar julgamento do segundo árbitro é lastreada pela reputação do primeiro árbitro.

Conclusão

Se os pontos postos por mim estiverem corretos, podemos esperar o aumento de confiança em mecanismo de reputação online, associado a um desenvolvimento de leis privadas. Até certo ponto podemos esperar o mesmo desenvolvimento no espaço real. Assinaturas digitais diminuem o custo da informação a terceiros, sendo ou não uma transação online. A existência de um grupo de árbitros online fará que contratos para arbitração privada fique mais comum e a confiança em arbitragem privada mais fácil para transações tanto no espaço virtual quanto no real.

APÊNDICE: Um pouco de matemática básica dos contratos de reputação

Eu disse que um dos determinantes para ver se o contrato de reputação está funcionando bem é é ver quanto custa para uma terceira parte descobrir se aquela firma trapaceou ou não no passado. Embora sendo óbvio intuitivamente, vale a pena checar se ela está certa através de um modelo de análise formas, mesmo que simples

Pense que existe um certo número de firmas, metade delas é honesta, metade dela é amoral. Uma empresa honesta nunca vai violar o contrato, já a amoral vai quebrar o contrato se isto aumentar sua riqueza - o valor presente de seus lucro de transações passadas e futuras.

A cada período uma empresa ganha a oportunidade de fazer um contrato de benefício múltiplo com uma empresa aleatória. Se as empresas concordarem com o contrato e o seguirem cada uma ganha o lucro π.

Cada contrato permite que uma das firmas (alguma das escolhidas aleatoriamente, mas conhecida antes do contrato ser assinado) a oportunidade de trapacear [13]. Se a empresa aceitar trapacear o seu lucro vais ser πc, e o lucro da empresa vítima vai ser πv. Eu assumo:

  • πc + π<2π (trapacear é ineficiente)
  • πv < 0 (para empresa é melhor não firmar contrato com uma empresa que trapaceia)
  • πc > 0 (a empresa tem um lucro maior se trapacear)

Antes de fechar o contrato, a empresa pode pagar a taxa de procura de S>0 para descobrir se a outra empresa já trapaceou alguma vez.

O jogo é jogado para sempre.

Com esses pressupostos, como as empresas vão agir? A empresa que tem a oportunidade de fazer um contrato onde ela é a empresa com possibilidade de trapacear ela faz o contrato sem investigar a empresa, pois o fato da empresa ser honesta ou não afeta o lucro esperado do contrato. Uma empresa, honesta ou não, que tem a oportunidade de um contrato que possivelmente vai fazer ela de vítima, vai fazer uma dessas coisas:

  1. Rejeitar a oportunidade;
  2. Aceitar;
  3. Gastar S para pesquisar se a empresa já trapaceou no passado e a partir disso ver se fecha ou não o acordo

Uma empresa desonesta que tenha a oportunidade de trapacear precisa comparar o ganho pela trapaça - πc - π- com a perda de oportunidade de firmar contratos no futuro, dado que se houver trapaça uma vez investigada as outras empresas vão recusar a oportunidade de fazer.

Como será o equilíbrio deste sistema? Uma característica, seguindo minhas premissas, é que uma empresa sempre vai trapacear quando tiver a oportunidade ou nunca vai trapacear. Isso segue a premissa que o que vai ser descoberto pela empresa que vai investigar é se ela trapaceou alguma vez, portanto se a empresa trapaceou uma vez ela não sofre perda de reputação por trapacear mais vezes. Com isso, uma das características do equilíbrio é que fc<=.5, a porcentagem de empresas que sempre trapaceiam.

O segundo ponto em definindo o equilíbrio é a escolha de estratégia por parte da empresa que talvez venha ser vítima de trapaças - qual porcentagem de empresas sempre confia na outra empresa (ft), qual porcentagem sempre desconfia (fd), portanto rejeita automaticamente qualquer contrato que talvez que talvez ela vire uma vítima e qual porcentagem sempre investiga (fi). Como essas são as únicas estratégias possíveis, temos que:

ft + fd + fi = 1

A condição para um equilíbrio é que, para cada um dos dois tipos de firmas, cada estratégia que a firma pode escolher produz o mesmo retorno esperado, com exceção das soluções de canto - situações em que há alguma estratégia que ninguém está escolhendo que produz um retorno menor. A condição para um equilíbrio estável é que, começando com o equilíbrio, uma empresa altera sua estratégia, o efeito será tornar essa estratégia menos lucrativa do que outra estratégia que a empresa possa escolher.

As equações relevantes são:

Retorno esperado da firma = resultado esperado de todos os casos em que ela é uma vítima em potencial somado a todos os casos em que ela é a traidora em potencial

O retorno esperado em um caso no qual ela é a vítima em potencial é:

  • <π>t = π* (1-fc) + πv (lucro esperado se ela escolher confiar)
  • <π>d = o (lucro esperado se ela decidir desconfiar) (equação 1D)
  • <π>s = π* (1-fc) -S (se ela escolher pesquisa)

Retorno esperado se ela for a traidora em potencial:

  • <π>n= π* (1-fd) (se ela nunca trapaceia) (equação 2N)
  • <π>c= πc * ft (se ela sempre trapaceia) (equação 2c)

Suponha que fc=0 - ninguém trapaceia. Como ninguém está trapaceando o melhor a fazer é aceitar o contrato sem fazer pesquisa, portanto ft = 1, entretanto isso implica que trapacear é sempre mais lucrativo do que não trapacear, portanto fc=.5. Com isso não se pode ter uma solução de canto em fc=0.

E quanto a outra solução de canto para potenciais trapaceadores - fc = .5? Resolvendo para o possível comportamento das vítimas temos que:

  • <π>t = π* (1-fc) + πv * fc = (π+ πv)(.5)
  • <π>d = 0
  • <π>s = π* (.5) -s

Portanto se π+πv>0 (o lucro de um contrato bem sucedido é maior que a perda em caso de trapaça) vítimas potenciais não vão desconfiar. Uma dessas:

  • S>-πv/2, neste caso a vítima em potencial sempre vai confiar, ou
  • S<-πv/2, neste caso a vítima em potencial sempre vai investigar, ou
  • S=-πv/2, neste caso a vítima em potencial é indiferente entre pesquisar e não pesquisar

Mas se a vítima em potencial sempre pesquisar então trapacear não compensa, portanto fc=/=.5

Portanto a solução de canto em fc=.5 (todo mundo trapaceia quando pode) só existe se S=>-πv/2

Agora considerando a solução interna: .5>fc>0. Alguns trapaceadores em potencial trapaceiam, outros não. Trapacear seria inequivocamente inferior a não trapacear se nenhum a empresa confiasse, portanto temos que ft>0. Trapacear seria inequivocamente superior a não trapacear se nenhuma vítima em potencial pesquisasse, portanto temos que fs>0. Portanto para ter uma solução interior, o valor de fc deve ser tal (das equação 1T e 1S):

  • <π>t=π*(1-fc)+ πvfc=<π>π(1-fc)-S

Então:

  • πv*fc=-S

Em outras palavras, o benefício da investigação, o poupado por não ter sido uma vítima, deve ser igual ao custo.

  • fc=-s/πv (equação 3)

Se os parâmetros forem tais, que <π>t=<π>s=<π>d=0, que requer que:

  • π=[Sπv]/[S+πv] == π

então um número indeterminado de vítimas vão escolher desconfiar. Porém como é só a proporção relativa de confiar e pesquisar que determina a diferença entre trapacear e não, isso não afeta o equilíbrio do valor de fc.

Combinando as equações 2N, 2C nós temos a solução interior:

  • <π>n= π(1 - fd) = <π>c πc fc
  • π* (1-fp) = πc * ft
  • Portanto ft = π(1-fp)/πc
  • Dado que ft = π/πc and fs= 1 - π/πc a não ser que π= π*
  • Agora temos a solução:
  • fc* = -S/πv, ft*=π/πc, fs*=1-π/πc

Ela é estável?

Se fc aumentar um pouco acima de fc*, o resultado de investigar aumenta, o de confiar diminui, então vítimas em potencial vão começar a deixar de confiar e passar a investigar. Isso diminui a recompensa de trapacear, jogando fc para baixo. Se ft aumentar um pouco acima de ft* (e fs diminuir de acordo) a recompensa por trapacear aumenta, trapaceadores em potencial começam a trapacear, isso diminui o resultado de confiar, jogando ft para baixo.

Isto não é uma análise formal completa da dinâmica do modelo, é difícil ver como alguém falaria de dinâmica rigorosa de um modelo simples como o meu, onde quando uma empresa trapaceia a sua reputação acabou para sempre. Porém parece que o equilíbrio é estável , ou, se você preferir, seria estável em um modelo um pouco mais complexo no qual as firmas ocasionalmente sobem para serem trocadas por outras firmas, que são livres para escolher a reputação delas.

A equação 3 mostra a fração de empresas que começam a trapacear conforma o custo de busca aumenta - de fato, ela é proporcional ao custo de busca em meu simples modelo - até chegarmos a S=-πv/2, no ponto que a solução de canto é fc=.5, seu valor máximo.

Portanto, em meu simples modelo, minha afirmação que diminuir o custo de busca faz o fortalecimento por reputação funcionar melhor - menos empresas acham que é benéfico trapacear - é verdade.

Notas de rodapé:

  • Gostaria de agradecer a Bruce Benson por permitir-me ler um manuscrito seu, que faz essencialmente o mesmo argumento que este artigo de uma perspectiva um pouco diferente. Me senti livre para me valer de suas referências quando elas eram relevantes para o meu argumento, e incluí um número de artigos relevantes de Benson na lista de referências no final deste artigo.
  1. Bernstein, Lisa, “Opting Out of the Legal System: Extralegal Contractual Relations in the Diamond Industry,” 21 JOURNAL OF LEGAL STUDIES, 1992, pp.115-157.
  2. Para uma discussão muito mais ampla sobre essas questões, ver Friedman (1996).
  3. Para uma discussão do porque as pessoas gostam de mais a privacidade, para os outros tanto quanto para si proprio, e da relação entre privacidade e tecnologia, ver Friedman (2000).
  4. Alguns leitores podem associar arbitragem principalmente a instituições para resolver disputas que são selecionadas somente após o surgimento da disputa. Neste artigo, meu principal interesse é em árbitros escolhidos antecipadamente - pelas partes quando assinam um contrato que pode levar a futuras disputas.
  5. O processo usado para assinaturas digitais no mundo real é um pouco mais elaborado do que isso, mas a diferença não é importante para os propósitos deste artigo. Uma assinatura digital é produzida usando uma função hash para gerar um resumo da mensagem - uma cadeia de números muito mais curta que a da qual é derivada - e depois criptografando o resumo da mensagem com a chave privada do remetente. O processo é muito mais rápido do que criptografar a mensagem inteira e quase tão seguro quanto. Isso também significa que é possível ler a mensagem sem se preocupar em verificar a assinatura.
  6. Estritamente falando, o que a terceira pessoa aprende é que o acusado não é confiável ou concordou em usar um árbitro desonesto ou incompetente. A última alternativa implica que, embora o acusado não seja desonesto, salvo no sentido muito limitado de se recusar a ficar preso por seu próprio erro, ele é incompetente.
  7. Como Bruce Benson apontou, esse desenvolvimento é estreitamente análogo ao desenvolvimento do Lex Mercantoria no início da Idade Média. Esse também era um sistema de lei privada fortalecido por penalidades de reputação, em um ambiente onde a lei estadual era inadequada para a execução de contratos, devido em parte à diversidade legal entre as jurisdições. Veja Benson (1998b, c)
  8. A primeira discussão sobre privacidade através do anonimato online, da qual tenho conhecimento, foi em uma obra de ficção de um professor de Ciência da Computação, a livreto de Verner Vinge “True Names”, incluída em True Names and Other Dangers. Uma boa descrição recente da combinação do anonimato com a reputação online ocorre no início da novela Earthweb de Marc Siegler.
  9. Earthweb contém uma ilustração divertida deste ponto. Um personagem central manteve duas personae on-line, uma para transações legais, com boa reputação e outra para transações quase legais, como compras de propriedade roubada, com uma reputação deliberadamente obscura. Em um ponto da trama, sua boa persona é a maior parte do caminho através de uma transação honesta e lucrativa quando lhe ocorre que seria ainda mais lucrativo se, tendo recebido o pagamento pelo seu trabalho, ele falhasse, no último minuto, entregar. Ele rejeita essa opção, alegando que ter uma pessoa com boa reputação acabou de lhe dar a oportunidade de uma transação lucrativa, e se ele destruir essa reputação, levará um bom tempo até que ele consiga outras oportunidades semelhantes.
  10. Ver, por exemplo, Nelson (1974), Williamson (1983), Klein e Leffler (1981).
  11. Para uma discussão de como tal moeda funcionaria, veja Friedman e Macintosh (a ser publicado).
  12. Uma solução para o problema é o uso de agentes de custódia por partes que compram bens valiosos no ebay.
  13. Uma firma que viola um contrato, mas paga uma indenização de acordo com os termos especificados no contrato, não trapaceou no sentido em que estou usando os termos. Para enganar, deve violar o contrato e não pagar quaisquer danos acordados previamente ou concedidos por um árbitro previamente acordado.

– Fonte: http://www.daviddfriedman.com/Academic/contracts_in_%20cyberspace/contracts_in_cyberspace.htm


Radicais na Web
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