Alguns pontos que devem ficar claros para quem participa do movimento

Revisado por: Cypherpunks Brasil

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Mestizo, Kakoy

1. Não pregue pra convertido, tente dar um foco em quem não é da área de tecnologia.

Pessoal de dev, eletrônica em geral tende a conseguir pesquisar solo sobre segurança e privacidade, Porém a população em geral não, por isso, devem priorizar e advogar pela privacidade1 à pessoas que justamente não tem muito contato com isso e não sabem a importância de manter sua privacidade. Será inútil se proteger e as pessoas ao seu redor se tornarem espiãs do estado de vigilância inconscientemente.

“A liberdade de todos é essencial para a minha liberdade” - Mikhail A. Bakunin

O mesmo serve quanto a nossa privacidade.

2. Não é porque uma idéia é diferente da sua que ela automaticamente é inimiga da sua visão.

Amir Taaki2 é um dos mais notáveis criptoanarquistas. Ele defendeu a experiência socialista de Rojava e inclusive foi lutar junto com povo curdo contra o Estado Islâmico. Derrick Broze3, que ouso dizer ser o maior nome do agorismo da atualidade, defende a experiência comunista de Chiapas e a considera legítima e também que é uma experiência contra-econômica. A maioria das vertentes anarquistas apenas discutem quais meios são melhores para abolir o estado, mas não necessariamente se contradizem. Vale lembrar que Konkin colocava o agorismo como esquerda radical4 justamente pelo potencial revolucionário que possuía. Claro que existem movimentos que não tem como andarem juntos, como o plataformismo e anarquismo especifista. Em geral o convívio entre vertentes anarquistas devem ser defendidas se as mesmas mostrarem uma boa convivência. Vale lembrar que os movimentos mutualista, ilegalista e anarquista individualista praticam a contra-economia de forma consciente e ainda escrevem bastante sobre o assunto.

3. Não estudem só a ideia em si, mas o contexto em que elas surgiram.

Isso é algo que muitos esquecem! O contexto é muito importante para entender como pensamentos políticos, sociológicos e econômicos se desenvolveram. Konkin não fazia juízo de valor de Marx, ao contrário, ele considerava que Marx era uma reação natural aos problemas que vieram junto com a revolução industrial e elaborou daí sua crítica à teoria de classe marxista.5 Estudem Max Stirner, Kropotkin, Emma Goldman, Renzo Novatore, entre outros6 e verão que eles têm muito a mostrar a vocês.7

4. Sindicatos autônomos são extremamente importantes para o funcionamento do mercado.

É comum as pessoas terem um pé atrás a respeito dos sindicatos. O motivo foi porque durante a era Vargas8 os sindicatos aqui no Brasil foram aparelhados pelo estado e anos depois criaram o imposto sindical para tentar legitima-los. Porém, sindicatos autônomos são voluntários. São uma forma legítima de trabalhadores se organizarem para negociarem melhores condições de trabalho. Existem situações em que sozinho não se consegue ir muito longe e estará sujeito aos ditames que o patrão decidir, porém com organização, é possível de fato negociar com os patrões e lutar por condições melhores de trabalho e de vida.9

5. Coletivo não é a mesma coisa que coletivismo, se organizem.

Muitos aqui tem medo de criarem coletivos justamente por causa dessa confusão. O Cypherpunks Brasil, o projeto Baixa Cultura,10 o Razão Inadequada,11 entre outros, todos esses projetos são coletivos. Não existe nenhum problema em grupos de pessoas se organizarem em prol de um interesse comum. Max Stirner havia criado o conceito de “União dos Egoístas”,12 que em resumo, seria a uma forma de pessoas se manterem unidas por vantagens e interesses mútuos. Se organizem, criem redes de apoio mútuo, grupos de estudo, ocupem espaços e coloquem os que tem a mesma visão juntos. A Secessão individual é extremamente importante, mas nos dias atuais o melhor jeito de conseguir se separar do estado é se organizando e se ajudando, criando métodos em conjunto para se separar do aparato do estado o máximo possível.

6. Hierarquias verticais não são naturais, são uma tentativa de emular a estrutura do estado em outras situações.

A existencia do próprio estado altera toda a estrutura social que ele ocupa, dessa forma, onde houver estado, haverá assimetrias de poder, privilégios, corrupção… E uma dessa estruturas a serem corrompidas é a estrutura trabalhista, onde temos um centro (patrão, empresa) do qual toma as decisões de maneira centralizada e distribui a renda obtida dessa forma. Com a derrubada do estado, todas as estruturas sofrerão mudanças, desde a familia, até a organização trabalhista, fazendo o trabalho tender a ser remunerado com bases em contratos de renda volátil (porcentagem dos lucros do empreendimento), dessa forma, há uma mistura e mescla do trabalhador à empresa e não apenas como uma terceirização (salários).

“Em uma sociedade agorista, a divisão do trabalho e o respeito próprio de cada trabalhador… provavelmente eliminará a organização empresarial tradicional — especialmente a hierarquia corporativa, uma imitação do Estado e não do Mercado. A maioria dos empreendimentos serão associações de contratantes independentes, consultores e outras companhias. Muitos podem ser apenas um empreendedor e todos os seus serviços, computadores, fornecedores e clientes." - Samuel Edward Konkin III.13

7. O Mercado é um fator histórico que transcende o capitalismo, não fruto do mesmo.

Acredito que quando terminarmos a revisão do Agorismo no Século 2114 e finalmente estiver publicado no nosso site isso ficará mais claro. Mas o mercado sempre existiu, o que devemos de fato é ocupar seu uso e tratá-lo como uma ferramenta, não como um fim, mas como um meio de uso e organização para enfim chegarmos na Ágora.

8. Zelar pelo seus dados fora da internet também é importante

Quem é da área de segurança sabe como é fácil atacar pessoas através de engenharia social,15 mas além disso, sempre é bom tomar cuidado com quem você entrega informações pessoais, seja segredos, pensamentos políticos, até mesmo o nome de algum familiar pode ser usado contra você se alguém estiver disposto a te atacar, seja parente, amigo, colega de trabalho, o que for.

9. Defender políticos e vertentes políticas estatistas não colaboram para diminuição ou desmantelamento do estado.

Isso pelo simples fato de as ideias a serem propagadas serem o de conciliamento com o estado, não o radicalismo de sua destruição. Sem contar o fato de existirem coisas mais importantes, como a aceitação pública, classes dominantes de setores da economia, intervenção nacional e internacional… Um político é apenas a marionete e acreditar em seus discursos é como uma criança acreditar no papai Noel.

“Um partido político por sua natureza busca o controle da máquina do monopólio da coerção legitimada - o estado. Os libertários buscam abolir o estado. Um partido político não consegue abolir o estado - faz parte da máquina eleitoral - faz parte do estado. A razão de ser de um partido político é capturar o estado. Qualquer um que tente lhe dizer algo diferente está falando coisas sem sentido” - Samuel Edward Konkin III.

10. Procurem fazer amizades locais, em sua cidade e estado.

Para assim formar grupos de apoio, tanto para ajudar um ao outro em relação a problemas financeiros, quanto para formar laços de companheirismo e apoio. Isso fortalece o movimento anti-estado e fornece um meio para a formação de relações cada vez mais complexas e independentes.

11. Montem grupos de estudo.

Não apenas de uma área, mas de várias, como sobrevivencialismo, escotismo, esportes, mercados, notícias… em grupo é possível juntar uma quantidade muito maior de conhecimento e assim fazer coisas que antes seriam impossíveis sozinho.

12. Façam projetos em conjunto.

Isso não apenas amplia seu conhecimento profissional, mas também fornece mais recursos disponíveis à comunidade. Cada projeto feito em código aberto, com foco na liberdade, sempre expande, pelo menos um pouco, a capacidade do indivíduo ou grupo de serem independentes do estado. Nunca é um trabalho jogado fora e é sempre uma oportunidade de ensinar aos iniciantes sobre como trabalhar em equipe e produzir conteúdo,

“Os grandes só nos parecem grandes porque estamos de joelhos. Levantemo-nos.” - Pierre Joseph Proudhon

13. Como defensores da liberdade, devemos ser responsáveis pelas nossas atitudes.

Por conta disso, certos atos não podem ser deixados de lado ou apenas considerados como algo de esquerdista ou outra coisa. Temas sobre racismo, lgbtfobia e violência contra as mulheres também deve ser levados em conta. Não é porque a esquerda usa e abusa desses grupos e outras minorias que elas devem ser excluídas, mas pelo contrário, deveriam também ser incluídas, já que isso minaria as possibilidades de discursos para a expansão do estado.

14. O meio ambiente também é importante e se envolver em projetos de conservação não o fará ser comunista.

Plantar árvores, reciclar o lixo, cuidar dos animais, conscientizar sobre os temas ambientais é importante e extremamente cativante, ajuda tanto sua saúde mental, na forma como as pessoas te veem, tanto como o movimento é visto. Obviamente esse não é o nosso foco, mas o agorismo de mercado verde16 de fato é algo que deve ser defendido.

“Podemos julgar o coração de um homem pela forma como ele trata os animais.” Immanuel Kant

15. Não sejam caretas de se tornarem máquinas de sua ideologia.

O mundo é muito mais que apenas regurgitar os mesmos argumentos em todo local. Saber diferenciar o local com quem se deve falar e como falar é muito importante, é uma habilidade social a ser desenvolvida. Mesmo que defenda com radicalidade a propriedade privada, não é preciso ser o ser mais pão duro do planeta, mesmo defendendo isso é possível ajudar ao próximo do qual precisa de ajuda e principalmente, ajudando seus familiares e amigos próximos a crescerem junto com você.

“Não há nada tão estúpido como a inteligência orgulhosa de si mesma.” - Mikhail A. Bakunin


Referências, recomendações e observações:


  1. Recomendo fortemente o material do autodefesa.org  ↩︎

  2. https://academy.bit2me.com/pt/quien-es-amir-taaki/  ↩︎

  3. https://cypherpunks.com.br/author/derrick-broze/  ↩︎

  4. Mesmo Konkin colocando o agorismo como esquerda radical, é preciso deixar algo bem claro. O Manifesto do Novo Libertário foi publicado na década de 80, porém, nas décadas seguintes surgiu uma corrente dentro do anarquismo chamado de Anarquismo pós-esquerda que se radicalizou para fora da espectro político tradicional, essa corrente engloba o anarquismo ontológico e fica evidente que o agorismo entra nesse conceito por sua ligação com o ilegalismo e com o individualismo  ↩︎

  5. https://invisiblemolotov.files.wordpress.com/2008/06/agorist_class_theory.pdf  ↩︎

  6. Muitos anarquistas clássicos estão no nosso site, vão conferir por data no início que acham eles. ↩︎

  7. Indicamos também a leitura do George Woodcock - História das idéias e movimentos Anarquistas Volume 1 e Volume 2; e o SEK3 - History of the Libertarian Movement.  ↩︎

  8. https://mundoeducacao.uol.com.br/historiadobrasil/o-corporativismo-na-era-vargas.htm  ↩︎

  9. https://cypherpunks.com.br/documentos/rumo-a-alianca-agorista-sindicalista/  ↩︎

  10. https://baixacultura.org/  ↩︎

  11. https://razaoinadequada.com/  ↩︎

  12. https://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_de_ego%C3%ADstas  ↩︎

  13. https://docplayer.com.br/9059377-O-manifesto-do-novo-libertario.html  ↩︎

  14. Ele já está disponível em nosso Github, caso queiram conferir e se possível contribuir revisando,nem que seja apenas um trecho, seriamos extremamente gratos. ↩︎

  15. https://www.kaspersky.com.br/resource-center/definitions/what-is-social-engineering  ↩︎

  16. https://cypherpunks.com.br/documentos/agorismo-de-mercado-verde/  ↩︎


Anarquismo e Criptomoedas
Agorismo no século 21: Uma revista filosófica

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